07 fevereiro 2005

Mais uma vez, a Maçonaria

Bem sei que este é um blog da Juventude Popular e não um blog Católico, mas não podia deixar de transcrever aqui um excerto da mensagem de quaresma do Sr. Dom José Policarpo, Cardeal Patriarca de Lisboa sobre um tema que já por diversas vezes aqui refleti, a Maçonaria.
Que eu me lembre, só um líder partidário foi alguma vez muito claro acerca da sua pertença à Maçonaria; foi o Dr. Paulo Portas, quando questionado por um jornalista acerca do seu envolvimento no "Caso Moderna" e, eventualmente, na Casa do Sino, que disse "Não sou, nunca foi nem nunca serei Mação."

A maçonaria e a definição do sentido da História
4. Entre as organizações que protagonizaram esta visão imanente e laicista da história, avulta a importância da Maçonaria que, a partir de meados do século XVII, fez sentir a sua influência em todas as grandes correntes de pensamento e nas principais alterações sócio-políticas. Não a referiria explicitamente, se um recente acontecimento não a tivesse trazido para as primeiras páginas das notícias e tivesse criado, em muitos católicos, interrogações e perplexidade. De facto, as cerimónias fúnebres de uma importante personalidade do Estado e membro destacado da Maçonaria, realizadas nos espaços da Basílica da Estrela, foram ocasião dessa confusão, não tanto por o “depósito” do defunto se ter feito numa das capelas mortuárias da Basílica, em princípio abertas a quantos respeitosamente as procuram, mas porque o Grão-Mestre da Maçonaria, com o nosso desconhecimento, convocou para um “ritual maçónico”, em honra do defunto, a realizar num espaço da Basílica. Esta iniciativa, que considero imprudente e indevida, provocou indignação em muitos católicos, que incessantemente têm pedido um esclarecimento da Hierarquia da Igreja.
É uma longa e atribulada história a das relações da Maçonaria com a Igreja durante os últimos três séculos, expressa em ataques, anti-clericalismo, rejeição da dimensão misteriosa da fé e da verdade revelada, a que a Igreja respondeu com várias condenações, com penas de excomunhão para os católicos que aderissem à Maçonaria. É um processo que tem de ser situado nas grandes transformações culturais e sócio-políticas desse período, em que elementos como a compreensão da natureza e legitimidade do poder político, a promoção e defesa da liberdade individual, os processos revolucionários em cadeia e a “questão romana” que pôs fim ao poder temporal dos Papas, foram pontos quentes a alimentar um conflito. Conceitos, então polémicos, como o da liberdade de consciência e de tolerância, são hoje aceites pela própria Igreja, no quadro de sociedades democráticas e pluralistas. A verdadeira reacção à visão do mundo veiculada pela Maçonaria, têm os católicos de encontrá-la na profundidade da sua fé, sobretudo quando a celebram na Eucaristia, como inspiradora da vida e da história, fonte de sentido e fundamento de uma ordem moral. Sem essa coerência de profundidade, cairão em rejeições e anátemas, pelo menos desenquadrados da actual maneira de conceber a missão da Igreja no mundo.
5. A questão crucial, sobre a qual os católicos têm o direito de esperar uma resposta do seu Bispo, é esta: a fé católica e a visão do mundo que ela inspira, são compatíveis com a Maçonaria e a sua visão de Deus, com o fundamento de verdade e de moralidade e o sentido da história que veicula? E a resposta é negativa. Um católico, consciente da sua fé e que celebra a Eucaristia não pode ser mação. E se o for convictamente, não pode celebrar a Eucaristia. E a incompatibilidade reside nas visões inconciliáveis do sentido do homem e da história.
A Maçonaria sempre afirmou, e continua a afirmar, a prioridade absoluta da razão natural como fundamento da verdade, da moralidade e da própria crença em Deus. A Maçonaria não é um ateísmo, pois admite um “deus da razão”. Exclui qualquer revelação sobrenatural, fonte de verdades superiores ao homem, porque têm a sua fonte em Deus, não aceitando a objectividade da verdade que a revelação nos comunica, caindo na relatividade da verdade a que cada razão individual pode chegar, fundamentando aí o seu conceito de tolerância. A Igreja também aceita a tolerância, mas em relação às pessoas e não em relação à objectividade da verdade.
Esta atitude perante Deus e perante a verdade gera uma “sabedoria” global, ou seja, uma visão coerente da realidade, que é incompatível com a visão do homem e da sociedade que brotam da fé cristã, que supõe a inter-acção de Deus e do homem, no diálogo fecundo e apaixonante da natureza e da graça. A Igreja tem o dever de orientar os católicos e é a eles que digo que a nossa fé e o sentido da vida que ela inspira é incompatível com o quadro gnóstico de sentido veiculado pela Maçonaria.
6. Haverá, ainda hoje, uma luta entre a Maçonaria e a Igreja? Não nos termos em que se pôs no passado, embora não devamos ser ingénuos: a Maçonaria, sobretudo em algumas das suas “obediências”, lutará sempre contra valores inspiradores da sociedade que tenham a sua origem na dimensão sobrenatural da nossa fé. Sempre que isso acontecer, demos testemunho da esperança que está em nós (1Pet. 3,15). A expressão de uma visão laicista da sociedade assenta também sobre a falta de coerência dos cristãos com as implicações sociais da fé que professam e da Eucaristia que celebram.